
Há um bocado dela que se esconde. Nas entrelinhas, nas ladainhas, na garoa que encharca – lentamente – o travesseiro, nos cílios que se agarram e nas pálpebras que se fecham, escondendo medos. É moça de faz de conta, fingidora. Fingi a dor que deveras sente, sempre que vê o mundo lhe fugindo das mãos e tempo lhe sufocando o ar dos pulmões. Quer gritar, mas a voz não ecoa. A tormenta não sai de dentro, nada transparece, mas dança firme perante a platéia que observa atônita, mal sabendo que ela sequer sabe os passos. Improvisa como pode, do jeitinho que dá e tenta se convencer de que possui a situação sobre controle, sorri pro espelho e suspira: não desanime, dona moça. É só mais um dia. E abraça o mundo com uma empolgação que não é dela e pr’aqueles que lhe vêem sempre, parece tudo sempre muito bem, obrigada. Mas ninguém sabe que, quando a cidade aquieta e se enche de sonho, ela desfalece e se permite ser, só um pouquinho, e chora e teme e se encara e chora outro tanto. Porque ela aposta – e alto – nela mesma. Porque ela tem – e muito – o que perder. Porque ela tem medo, conhece seus limites e tem dias que dói um bom bocado passar por cima deles. Fingir ser mais do que se é. Enganar que está tudo bem, que tem o tempo na palma das mãos – e que sabe o que fazer dele.
Maria Fernanda Probst
PALAVRAS E SILÊNCIO
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